Abaixo, matéria extraída do site da Revista Lugar de Notícias
O desafio está lançado. A corrida por um mundo ecologicamente
equilibrado está tomando grandes proporções e o setor empresarial deve se
adequar urgentemente. E quanto às rochas ornamentais? Realmente dá para se
enquadrar nessa realidade?
REPORTAGEM
Sara Moreira FOTOS Márcia Leal
Foi dada a largada – o que não significa que
fora dada a tempo. Pessoas físicas e jurídicas precisam projetar e colocar em
prática uma vida/empresa ecologicamente correta, que não deixe de dar qualidade
e conforto/lucros, mas que não seja à custa dos recursos naturais. Cientistas,
estudiosos, ativistas e pessoas do gênero já provaram “por a mais b” que é
preciso, sim, se adequar às exigências ambientais, garantindo a perpetuação da
raça humana no planeta. É mais que uma questão de sustentabilidade. Virou
questão de bom senso.
Geralmente quando se fala em extração de
rochas, a imagem que vem à mente é a de uma enorme área desmatada com uma pedra
de tamanho incalculável sendo dissecada ali mesmo. E em geral é assim mesmo que
ocorre. A diferença, já não tão novidade assim, é que nos últimos tempos, está
surgindo uma nova espécie de empresário do setor; sem contar o tipo que se
camufla e defende a falsa bandeira da “economia verde”, está despontando uma
classe de empresários realmente preocupada em devolver um pouco, ou muito, do
que fora tirado da natureza em prol do setor.
“Mediante a efetiva presença do poder
público (órgãos fiscalizadores) junto às diversas modalidades de mineração, os
empresários e seus consultores têm procurado melhor mitigação do impacto
ambiental, entendimento com as comunidades locais e compensação por danos não
mitigáveis, propiciando melhoria da imagem da mineração junto à sociedade”,
afirmou Flávia de Godoi, Coordenadora de Licenciamento de Mineração do
Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema).
Segundo dados do Instituto, o número de
autos de multa e intimação caiu, se comparado a 2011 e 2012. Porém, os autos de
interdição e embargo aumentaram no mesmo período. Ainda há muito que se fazer,
e em todas as esferas, seja pública ou privada.
O Espírito Santo é o maior
produtor, processador e exportador de rochas no Brasil. Cerca de 75% das
exportações em dólares e 67% em volume de todas as rochas exportadas pelo país
no ano passado saíram do Estado. Segundo informações divulgadas pelo Sindicato
das Indústrias de Rochas Ornamentais, Cal e Calcário do Espírito Santo
(Sindirochas), a atividade de rochas ornamentais contribui com cerca de 8% do
PIB capixaba e gera em torno de 120 mil empregos diretos e indiretos.
Números grandes, assim como a
quantidade de empresas no Estado. De acordo com levantamento do Iema, no total
são 1.543 processos de licenciamento ambiental da atividade de extração de
rochas; destes, 427 (28%) possuem requerimento de primeira licença ainda
aguardando análise técnica (cada processo de licenciamento tem no mínimo três
requerimentos de licença). “Um dos entraves do setor no Estado é a falta de
cumprimento de prazos para análise de processos e liberações de licenças, seja
por paralisia, inoperância ou omissão no desempenho das obrigações.
Nossa vigilância é permanente
nos assuntos relacionados ao meio ambiente, que é agravada pela burocracia para
se obter o licenciamento”, afirmou o presidente do Sindirochas, Samuel
Mendonça. Dados do Iema apontam que entre 2011, 2012 e janeiro de 2013, 275
empresas foram autuadas pela Coordenação de Licenciamento de Mineração do Iema.
Já pela Gerência de Fiscalização
do mesmo instituto, entre multas, intimações e embargos, foram 54 em 2011; 44
autuações em 2012; e três em janeiro deste ano. Outro desafio foi, e continua
sendo, a crise internacional, que teve os primeiros sinais em 2007 e afetou de
maneira catastrófica o setor. “A crise foi enfrentada a partir de muita
criatividade, do uso de novas tecnologias e a maior atenção voltada ao mercado
interno”, afirmou Mendonça. Segundo ele, a atual crise econômica na Zona do
Euro não afetou significativamente o setor. “Observa-se que o mercado de rochas
ornamentais no Brasil está bem mais maduro. A crise mundial e a crise
imobiliária americana, bem ainda a crise pela qual passa boa parte dos países
europeus, despertaram nas empresas de rochas necessidades de trabalharem de
forma mais planejada, de valorizarem mais o mercado interno, de analisarem
riscos, de buscarem formas para redução de custos e obtenção de uma maior
produtividade a partir da capacitação de pessoal, da melhoria de processos e
produtos e da implantação de novas tecnologias”, ressaltou o presidente do
Sindirochas. Investimentos em novas tecnologias e também na busca de
profissionais especializados, principalmente na área ambiental, vem tomando
forma no perfil das grandes empresas.
Bióloga na extração de rochas
Em Cachoeiro de Itapemirim, o
maior polo de beneficiamento de rochas ornamentais das Américas e segundo maior
do mundo, uma empresa em especial foi além das condicionantes ambientais
exigidas pelo Estado.
Há três anos, a Bióloga e Mestre
em Engenharia Ambiental, Giselle Intra, tem a carteira assinada na empresa
Marbrasa. “Quando falo para algumas pessoas que sou bióloga e trabalho numa
empresa de extração de rochas, elas não conseguem associar uma coisa à outra e
acham estranho”, brincou. Mas trabalho não falta. Afinal, quatro caminhões com
20 toneladas de lama abrasiva saem por dia da empresa rumo a tratamento e
destinação final; todo o entorno da sede e das nove jazidas estão em processo
de reflorestamento; ela ainda ajuda a cuidar de um bosque de 4,7 mil metros
quadrados e 670 mudas que está sendo finalizado nos fundos da empresa;
fiscaliza os licenciamentos ambientais, o cumprimento das condicionantes e os
processos de reutilização de água; e também realiza palestras de educação
ambiental para os 320 funcionários, ensinando-os a separar e descartar o lixo
de forma correta.
“Não é nada fácil, mas é
recompensador ver os frutos”, afirma Giselle, fazendo questão de mostrar, com
orgulho, o bosque e descrever todas as espécies: pau-brasil, ibisco, cajá,
pitanga, pata de vaca, aroeira, coqueiro, jequitibá rosa e muitas outras.
Segundo a bióloga, a preocupação
com o meio ambiente tornou-se primordial na empresa. “Prova disso é que, no
quesito reflorestamento como condicionante, 44,52% das áreas verdes são as
exigências legais; o restante, 55,8% das áreas foram reflorestadas pela própria
empresa, sem ter essa obrigação”, afirmou Giselle. Além do reflorestamento, a
Marbrasa também investiu em equipamentos que diminuem os impactos. Foi
inaugurado no ano passado na jazida de Colatina, norte do Estado (considerada a
maior do país), as instalações de um Tear multifio e 3 bi-fios, que são capazes
de produzir 20 mil metros quadrados de chapas de granito preto São Gabriel.
Na prática, as pedras são
serradas no local da extração, evitando transportes e outros impactos. Ao lado
da nova estrutura está pronto o mais moderno sistema de filtro prensa existente
no país, que elimina o processo gerador de lama abrasiva.
Empresas diminuem impactos
do setor
A necessidade de descarte da
lama abrasiva e de outros resíduos tem se tornado preocupação dos empresários
do ramo, que cada vez mais procuram empresas especializadas neste tipo de
serviço, também chamado de “logística reversa dos materiais”. Duas delas vem se
destacando no cenário. Com sede em Vila Velha, a empresa Cycle nasceu há dois
anos e já possui uma significativa carteira de clientes – três deles são
empresas de rochas. Juntas, essas empresas descartam mais de 1,6 mil toneladas
de resíduos por mês. “Recolhemos esses materiais, inclusive os resíduos
perigosos de Classe I, reaproveitamos e devolvemos aos diversos setores do
mercado. Também realizamos orientação a essas empresas quanto ao descarte
necessário”, afirmou Cláudio Carneiro, Gerente Operacional.
Outra empresa especializada em
destinação correta da lama abrasiva é a Associação Ambiental Monte Líbano
(AAMOL), fundada há seis anos em Cachoeiro de Itapemirim. Parte da lama
abrasiva é depositada num aterro ambientalmente correto, e a outra parte é
reaproveitada para a produção de blocos de concreto. Um estudo inédito está
sendo realizado em parceria com Universidades para a produção de argamassa a
partir dessa mesma lama. Se tudo der certo, será uma excelente alternativa de
reutilização dos resíduos na construção civil e o meio ambiente agradece.
Artesanato de resíduos
Em Cachoeiro de Itapemirim, bons
exemplos de reciclagem de resíduos não faltam. A partir de sobras de pedras que
não podem ser utilizadas nas indústrias, o artesão Romário Simão da Rosa
fabrica elegantes peças de design arrojado. Seus trabalhos ganharam destaque no
“Catálogo do Artesanato Capixaba 2012” e podem ser conferidas no site
www.rrgranitos.com.br. Mais informações: (28) 9884-2961.
Entrevista
Flávia Karina Rangel de
Godoi, Coordenadora de
Licenciamento de Mineração do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos
Hídricos (Iema), fala com exclusividade à Lugar de Notícias sobre os desafios
do Estado em relação ao setor rochas e meio ambiente.
Qual a preocupação do Iema em relação ao meio ambiente no setor de
rochas?
O desafio da gestão ambiental do
setor de mineração é grande e impõe a necessidade de um trabalho rigoroso em
função da sua importância socioeconômica, dos impactos ambientais causados
pelas atividades, da necessidade de interação com outros órgãos (DNPM, Idaf,
prefeituras), bem como da necessidade de promover e difundir uma cultura de
exploração racional e que respeite o meio ambiente, além da própria demanda
burocrática.
Das condicionantes exigidas, quais os empresários encontram maior
dificuldade de cumprir e por quê?
O maior desafio das empresas é,
sem dúvida, proceder com a correta disposição dos refugos da lavra, comumente
denominados de rejeitos, que são os fragmentos de rochas não aproveitáveis
economicamente e que em grande parte das empresas o volume gerado chega a ser
maior que o volume de blocos comerciais. As dificuldades se iniciam na escolha
do lugar adequado, pois demandam áreas extensas e com características
específicas; o método de transporte e o método de disposição, tendo em vista
que a gestão desses fragmentos não é tarefa fácil e requer cuidados
permanentes, principalmente para garantir estabilidade mecânica, segurança,
conformação topográfica e harmonia paisagística. Outro ponto de grande
dificuldade para as empresas está relacionado à condicionante sobre exigência
de execução de medida compensatória pelos danos ambientais irreversíveis
provocados pela atividade, onde na maioria dos casos refere-se ao
reflorestamento. A dificuldade está em encontrar áreas disponíveis para tal. Na
falta dessa área disponível, a empresa acaba optando por apresentar medidas
alternativas.
O Instituto percebeu alguma melhoria na percepção dos empresários
do setor de rochas em relação à preservação ambiental?
Sim, mediante a efetiva presença
do poder público junto às diversas modalidades de mineração, seja através do
Iema, Polícia Ambiental e demais órgãos fiscalizadores, os empresários e seus consultores
têm procurado melhor mitigação do impacto ambiental, entendimento com as
comunidades locais e compensação por danos não mitigáveis, propiciando melhoria
da imagem da mineração junto à sociedade. Para 2013 está prevista a realização
de novas palestras voltadas aos empresários/empregados das áreas de extração
(pedreiras), a ocorrer em municípios da região Sul e Noroeste do Estado. A
agenda das palestras, assim que concluída, será devidamente divulgada pelo
Sindirochas. Essa melhoria na percepção está muito relacionada, também, com o
caráter orientativo adotado pelos técnicos quando realizam as vistorias, ou
seja, aplicam as penalidades quando necessário, mas ao mesmo tempo procuram
orientar o empreendedor sobre como proceder tanto tecnicamente quanto
administrativamente, para corrigir as irregularidades constatadas.
Como conter a extração ilegal? O que já é feito e o que pode
melhorar?
O Iema possui analistas atuando
diretamente na fiscalização das atividades ilegais, bem como na fiscalização do
controle ambiental visando o efetivo cumprimento das condicionantes impostas
pelas licenças ambientais, através de constantes vistorias de campo. Ocorre
que, infelizmente, o número de analistas frente à demanda ainda é insuficiente
e a presença dos mesmos em campo não é permanente, o que propicia a execução de
atividades ilegais. Estas vistorias são planejadas conforme o recebimento das
denúncias formuladas pelo Disque Denúncia ou Internet, e as providências
tomadas decorrem da aplicação da Lei Estadual de Fiscalização nº 7.058/2002,
podendo ocasionar a lavratura de autos de multa, de interdição e/ou apreensão
de máquinas/equipamentos. Para intensificar o poder de autuação pelo órgão
ambiental é recomendado que as denúncias sejam encaminhadas com o maior detalhamento
possível, principalmente com indicação correta do local e descrição do suposto
dano/crime ambiental. Além disso, é muito importante a efetiva colaboração dos
demais agentes ambientais (funcionários das Secretarias Municipais de Meio
Ambiente, Obras, Agricultura e outras; Polícia Militar Ambiental; Ibama; Idaf;
DNPM e outros), os quais também possuem competência legal para efetuar
diligências nos locais e registrar as ocorrências verificadas. Ações voltadas
para a diminuição da burocracia, redução no tempo de emissão das licenças,
construção de regras mais claras (facilidade de entendimento) e capacitação de
empreendedores e consultores são exemplos do que ainda pode ser melhorado.
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