China busca estimular desacelerada economia e as exportações do país. Medida
afeta cotação do dólar e empresas que vendem para a China.
Darlan
Alvarenga - Do G1, em São Paulo - Atualizado em 12/08/2015 18h24
Desvalorização
do iuan é a mais alta em mais de duas décadas (Foto: AP)
A China
surpreendeu os mercados ao desvalorizar a sua moeda ante o dólar, em uma
manobra para ajudar as exportações, tornando o produto chinês mais barato no
exterior, em um momento de desaceleração da segunda maior economia do mundo.
Em dois dias, o iuan chinês caiu cerca de 3,5% em relação ao dólar, atingindo
a mínima em quatro anos. Trata-se da maior desvalorização desde que a China
estabeleceu em 1994 o sistema moderno de flutuação da moeda.
Embora o
Banco Central descarte a possibilidade de uma desvalorização contínua da
divisa, afirmando que a medida é parte de uma reforma do sistema cambial, com o
objetivo de aproximá-lo do mercado, o movimento passou a alimentar temores de
uma guerra cambial entre países e acusações de que Pequim está concedendo
vantagem desleal aos seus exportadores.
Além das
turbulências geradas nos mercados financeiros internacionais, a forte queda do
iuan gera impactos no comércio internacional, pois prejudica companhias focadas
em exportação e que têm a China entre os seus principais mercados.
Analistas
avaliam também que com uma possível maior entrada de produtos chineses nos
Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) poderá
aguardar mais tempo para aumentar as taxas de juros, que estão próximas de zero
desde o fim de 2008.
O Brasil
passa a ser afetado pelo fator adicional de incerteza no câmbio e, do ponto de
vista do comércio exterior, a desvalorizarização da moeda chinesa pode
prejudicar as empresas brasileiras focadas em exportação, sobretudo de
commodities - principais itens importados do Brasil pela China.
Confira
abaixo 10 perguntas e respostas sobre a desvalorização da moeda chinesa:
Por
que a China está fazendo isso agora?
A questão
de fundo é a desaceleração da economia. A desvalorização da moeda pode
impulsionar as exportações - setor chave da economia chinesa, com peso de cerca
de 40% do PIB do país -, que ficam mais baratas para os compradores.
A China
cresceu 7,4% em 2014, o pior resultado em quase 25 anos, e em 2015 a
desaceleração é ainda mais considerável, com um avanço de 7% no primeiro
semestre.
Em julho,
as exportações chinesas caíram 8,3%.
"Alguns
problemas já vem se acumulando na China como a bolha imobiliária e a bolsa de valores
supervalorizada. A China pode até gerar um volume de produção maior, mas o fato
é que não tem consumo no mundo para absorver essa produção", explica
Carlos Stempniewski
Economista e professor de Comércio Exterior das Faculdades Rio Branco.
Economista e professor de Comércio Exterior das Faculdades Rio Branco.
Quais
os efeitos diretos da desvalorização?
Para a
China, a desvalorização pode impulsionar tanto as exportações como o
crescimento econômico. Em tese, os Estados Unidos e outros países tendem a ser
atraídos a importar mais produtos da China.
"A
desvalorização da moeda faz com que os produtos deles fiquem mais baratos ainda
no mercado internacional, com isso desestabilizam parcialmente alguns
concorrentes mais próximos e conseguem vender um pouco mais", diz
Stempniewski.
Quem
ganha e quem perde?
Quem mais
se beneficia com a medida são as empresas chinesas, sobretudo as companhias com
volume elevado de vendas fora do país em dólar, que poderão conseguir até mesmo
uma redução de seus custos.
Do lado dos
que podem sair perdendo estão as empresas altamente dependente de vendas para a
China e multinacionais com operação dentro da China como a Apple, uma vez que
um iuan mais fraco significa menos receita quando as exportações ou o
faturamento em moeda local são convertidos em dólar.
Como
os mercados financeiros reagiram?
A desvalorização
da moeda chinesa pegou o mercado de surpresa e a escala da desvalorização
resultou em quedas nas bolsas de valores e na valorização do dólar.
As ações
mais afetadas foram as de montadoras alemãs e empresas europeias de artigos de
luxo, para as quais a China é um importante mercado. Os mercados das
commodities e do petróleo também registraram queda.
O Fundo
Monetário Internacional (FMI) saudou a "etapa positiva" inaugurada
com os anúncios de Pequim sobre uma maior flexibilidade de sua moeda, e afirmou
que esta medida não terá "implicações diretas" sobre sua decisão de
integrar ou não o iuane às moedas de referência internacional.
Analistas
acreditam em uma desvalorização ainda maior do iuane, de forma mais gradual. A
SG Global Economics prevê "uma tendência de maior desvalorização", de
até 5% nos próximos 12 meses.
Quais
as preocupações com a desvalorização do iuan?
Ainda que a
medida possa representar um estímulo às exportações, aumentaram os temores de
uma maior desaceleração do crescimento chinês, o que levaria a uma contração da
demanda por matérias-primas.
"Boa
parte do que eles produzem também depende de importação. Se a China manter esse
pretenso ritmo econômico e se isso gerar inflação, o tiro pode sair pela
culatra", avalia Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset
Managemen. "O movimento deles foi meio atropelado e isso pode ter
consequências de longo prazo complicadas", alerta.
Alguns
analistas acreditam que a desvalorização poderá desencadear guerras cambiais,
com a desvalorização da moeda de outros países emergentes, na tentativa de se
tornarem mais competitivos.
Pode ter
efeito na política de juros nos Estados Unidos?
Analistas
consideram que com o dólar mais valorizado frente ao iuan, o Federal Reserve
(Fed, banco central americano) pode aguardar mais tempo para aumentar as taxas
de juros, uma vez que a alta do dólar pode servir de entrave à recuperação da
economia dos Estados Unidos.
"A
desvalorização da moeda chinesa acabou por fazer artificialmente um aperto
monetário para os Estados Unidos, uma vez que em toda elevação de juros há
valorização cambial. E isso pode levar o FED a adiar o processo de alta dos
juros", diz Vieira.
A
medida afeta a cotação do dólar no Brasil?
A
desvalorização do iuan fez elevar a incerteza em relação ao início do processo
de elevação dos juros nos Estados Unidos, trazendo mais instabilidade para a
cotação do dólar no Brasil, que nos últimos dias.
Juros mais
altos nos EUA tendem a atrair para o país recursos atualmente aplicados em
mercados como o Brasil, motivando uma tendência de alta do dólar.
Como
ficam as importações e exportações do Brasil?
Os
analistas avaliam que o real mais fraco deverá compensar os impactos da
desvalorização da moeda chinesa no comércio brasileiro. No acumulado no
ano, a moeda dos EUA já subiu cerca de 30% frente ao real. Ou seja, a
desvalorização do real foi bem maior que a do iuan.
"As
importações podem aumentar, uma vez que seus produtos chineses tendem a ficar
mais baratos. Mas isso tudo depende de uma relação global de dólar que ainda
está instável", explica o economista-chefe da Infinity. "Não é
questão de vantagens ou desvantagens. Trata-se na verdade de um cenário repleto
de incertezas, por enquanto", completa.
Para
Stempniewski, o impacto maior será sentido pelas empresas brasileiras que
vendem para a China. "Como o iuan passa a valer menos na relação com o
dólar, a China vai passar a pagar menos pelas commodities, afetando a
lucratividade dos exportadores, que terão que aumentar o volume de vendas ou o
preço para conseguir a mesma quantidade de dinheiro", explica.
O
resultado da balança comercial brasileira pode ser afetado?
No
acumulado do ano até julho, as exportações brasileiras superaram as importações
em US$ 4,59 bilhões. O país também acumula superávit no comércio bilateral com
a China. As exportações para os chineses, entretanto, recuaram 19% na
comparação com os primeiros 7 meses de 2014, para US$ 22,5 bilhões. Já as
importações caíram 7,4%, para US$ 19,9 bilhões.
Para os
anaçistas, o impacto da China no resultado da balança comercial brasileira será
mínimo. "A economia brasileira parou, não estamos importando praticamente
nada, então essa desvalorização do iuan não vai fazer nem cócegas na balança
comercial", diz Stempniewski.
"O
mais imediatamente afetados serão aqueles que concorrem no mercado
internacional diretamente com os produtos da China. Nós não concorremos em
praticamente nada. Ou seja, o impacto para quem tem algo em torno de 1% do
comércio mundial é praticamente nenhum", completa.
Como
funciona o sistema cambial da China?
O Sistema
de Comércio Exterior da China, que opera o mercado de câmbio, e o Banco Central
do país fazem uma pesquisa no mercado a fim de estabelecer uma taxa de
referência diária, também conhecida como taxa de paridade central. Por esse
sistema, permite-se que iuan pode subir ou descer até 2% por dia.
Até o
momento, as autoridades chinesas afirmavam que a cotação da moeda era baseada
em informações dos operadores do mercado, mas na terça-feira o Banco Central
destacou que vai incorporar ao cálculo indicadores como o fechamento do dia
anterior, dados do mercado cambial e as cotações das principais moedas.
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